“A partir do momento que o contrato for realinhado, a gente volta a operar normalmente”

A Santa Casa de Campo Grande enfrenta desafios significativos, desde a suspensão de cirurgias eletivas e o atendimento focado apenas no pronto-socorro até a falta de realinhamento contratual com o município.Em entrevista ao Correio do Estado, a presidente da instituição, Alir Terra Lima, abordou temas como o impacto da crise financeira, a necessidade de novos leitos hospitalares e a disputa judicial envolvendo um repasse de R$ 47,7 milhões. Ela também comentou sobre a possível criação de um hospital municipal e os efeitos da superlotação na unidade. A suspensão de alguns serviços, como as cirurgias eletivas e os atendimentos de especialidades médicas, afeta de alguma forma a ala privada? Não, não afeta em nada, porque são coisas diferentes.Qual o porcentual de atendimentos feitos na Santa Casa entre privados e públicos?O [atendimento] privado é muito pequeno, porque são os convênios que a gente atende.
E os convênios, eles não têm grandes acidentes, é raríssimo. É uma coisa muito rara. Até porque as pessoas que pagam os convênios são pessoas mais idosas e os jovens não usam tanto.
Então, a proporção [de atendimento particular] é ínfima, não dá 3%. A área privada é mais atendimento de rotina, criança que está com febre ou alguma outra questão em relação à programação de médicos que já trazem o paciente. Em relação à intenção da prefeitura de criar um hospital municipal, qual é sua visão sobre isso? De alguma forma ajudaria a Santa Casa nessa questão de superlotação de pacientes?Olha, o que eu tenho que falar é que na cidade falta leitos porque faz tempo que não foram feitos [novos leitos].
Fazer alguma consideração a respeito da gestão do município não é próprio para nós, até porque somos uma instituição filantrópica.Sim, mas você vê essa possibilidade de um hospital municipal ajudar na questão da superlotação, de o pronto-socorro ir para o hospital municipal?Mas eu não sei como eles vão fazer esse hospital, essa que é a questão. A única coisa que nós podemos falar é que o estado de Mato Grosso do Sul, como ocorre com o governo do Estado, que está aumentando leitos criados nos hospitais, é sempre muito bom, assim como a vinda de mais leitos. Agora, a forma como vai ser feito, a gente não tem como falar.
Quanto aos pacientes, além de atender o município, a Santa Casa acaba atendendo pessoas de outros estados. Com relação a esse fluxo de pacientes de outros estados, também acaba gerando superlotação ou uma carga maior de atendimentos para o hospital? Aquilo que a gente atende é tudo regulado pela Sesau [Secretaria Municipal de Saúde de Campo Grande]. Ninguém entra direto aqui na Santa Casa, é isso que a população precisa entender.
Se uma pessoa chegar aqui de algum lugar e apresentar uma carteirinha do SUS e vier direto, a gente não atende. Tudo é regulado pela Sesau. Então, nós não temos o poder de atender pessoas que não sejam reguladas pelo município, porque ele é o gestor pleno da Saúde.
As pessoas que a gente atende sem regulação são pela via privada. E não tem nenhuma interferência para nós, porque tudo é regulado pelo município, não é regulado pela Santa Casa. Para retomar esses atendimentos suspensos das eletivas, o que precisa ser feito? O realinhamento do contrato e o pagamento dos médicos.
A partir do momento que o contrato for realinhado, com tudo certinho, a gente vai poder cumprir nossas obrigações e voltar a operar normalmente. Com relação aos recursos, como é vista a questão do repasse do dinheiro do município e do Estado? É o suficiente para a gestão ser feita da maneira correta? Como você analisa o montante que é recebido do poder público pelo hospital? Não é repasse, é pagamento de serviço. O município é o gestor pleno da Saúde, quem recebe o repasse do governo federal e do governo estadual é o município.
E aí ele contratualiza com a Santa Casa. A tabela praticada, que foi aprovada pelo governo federal, é de 2008. Ela foi promulgada em 2008, então, essa tabela é muito defasada.
E o contrato com o município faz dois anos que não tem o realinhamento. Mas nós temos várias obrigações em relação ao dissídio coletivo, os funcionários têm direito ao aumento de salário em todas as áreas, médico, enfermeiro e as partes que são multiprofissionais. Houve uma inflação do remédio no período.
Temos muitos materiais que são importados, que são fornecidos para a Santa Casa, como próteses, que as empresas fornecem e importam, e o dólar também subiu. Então, hoje, o valor do contrato com o município é insuficiente. Além da base de 2008, o contrato está há dois anos sem sofrer realinhamento.
Por isso que ele é insuficiente. Houve um ofício da Santa Casa informando ao município sobre o resultado de um processo de R$ 47,7 milhões no Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul. O que seria esse valor e qual o motivo do processo?Na época da pandemia de Covid-19, o governo federal disponibilizou para todos os hospitais do Brasil um determinado valor.
Aqui em Campo Grande, à época, o valor foi repassado para a Santa Casa, e naquela época não se exigia metas. O município de Campo Grande, na época, expediu uma resolução, por meio do secretário de Saúde, repassando o dinheiro para a Santa Casa, mas com a exigência de metas. E a lei federal não falava na exigência de metas.Nós recebemos só 50% do valor enviado.
Tentamos administrativamente e foi negado. Aí, o nosso jurídico entrou judicialmente e nós nos sagramos vencedores, pois tínhamos de ter recebido tudo. Então, com a correção, todo esse valor chegou a esse montante, que estamos esperando o fim da ação para que esse dinheiro seja disponibilizado para a Santa Casa de Campo Grande.
Esse valor é importante para nós e gostaríamos de ter a oportunidade de receber o mais rápido possível. Enviamos o relatório para o município já ficar ciente de que é uma coisa que vai ajudar muito a população, porque todo o dinheiro que entra aqui é para o cuidado da população.Há um outro valor sendo cobrado da administração municipal que deixou de ser pago para a Santa Casa, não é mesmo?O governo do Estado colocou um valor de R$ 2 milhões, e o município colocou R$ 1 milhão. O que aconteceu é que mudou a gestão, e o Estado, como disse que ia organizar isso, continuou pagando, mas o município retirou esse R$ 1 milhão.
Com isso, nesse período de lá até aqui, acabamos ficando com esse deficit da retirada desse valor. Como está a dívida da Santa Casa com os bancos? O pagamento de empréstimos abocanha qual porcentual dos repasses? Olha, o que acontece é o seguinte, já desde muitas gestões atrás, quando a Santa Casa entra nessa questão do deficit – que não é um privilégio da Santa Casa, pois o Brasil inteiro está assim –, o que acontece é que a Santa Casa recorreu a empréstimos bancários para manter o serviço. E é óbvio que o banco cobra juros e esse deficit vai aumentando.
Porque, em um momento desse, por exemplo, o que a gente vai fazer para atender a população? A gente recorre a empréstimo bancário, porque somos filantrópicos. E para nós é muito doído ver que não temos condições de atender a população. Então, a gente atende urgência e emergência e resolve a questão como a gente consegue resolver.
Como está a situação do Colégio Oswaldo Cruz? Como a crise financeira da Santa Casa afeta os planos para a unidade? O que será feito lá?Não, não afeta. Porque o Colégio Oswaldo Cruz foi uma doação do professor Luiz Alexandre de Oliveira para a Santa Casa e na escritura dessa doação já consta que era para ser uma unidade de educação. E a Santa Casa desde sempre tem a Escola da Saúde, que só foi mudando o estilo dela.
Ela simplesmente vai ser transferida para lá. A reforma de do Colégio Oswaldo Cruz foi feita com uma ação que a Santa Casa ganhou ainda na época da intervenção. Então, foi recebendo o dinheiro e o dinheiro foi aplicado lá, porque, pela lei, esse dinheiro tinha que ser aplicado lá para a restauração dele [Colégio Oswaldo Cruz].
Só está faltando a parte do estacionamento, tudo para escola ir para lá. PERFILAlir Terra Lima Perita judicial, formada em Direito, com especialização em Mediação e Direito Canônico – Intel/UCDB, pós-graduação em Direito do Estado e formação em Gestão de Redução de Custo para a Eficiência na Gestão e Práticas forenses pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Foi coordenadora da Secretaria Judiciária do Tribunal Regional Eleitoral do Estado de Mato Grosso do Sul (TRE-MS) por 3 anos, assessora-chefe da Corregedoria do TRE-MS por 14 anos, diretora-geral do TRE-MS por 10 anos, assessora parlamentar da Câmara dos Deputados por 2 anos e assistente da Secretaria de Administração e Orçamento, aposentando-se como funcionária pública federal.
Atuou também como vice-presidente da Associação Beneficente de Campo Grande Santa Casa na gestão 2020-2022, sendo eleita presidente para a gestão 2023-2025. Coordena ações na gestão de RH, no departamento jurídico e no Plano Santa Casa Saúde.Assine o Correio do Estado@@NOTICIAS_RELACIONADAS@@.
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