Mauricio de Sousa ganha cinebiografia desenhada para seduzir o público e narrar seus triunfos como quadrinista e empresário

Foto © Vantoen Pereira Jr.

Por Maria do Rosário Caetano

Um filme sobre Mauricio de Sousa? Mas por quê? O que há de empolgante em vida marcada por tamanho sucesso? Já não bastam os muitos filmes feitos sobre suas criaturas desenhadas e impressas em milhões de exemplares de jornais e revistas? E, inclusive, colocadas em movimento em dezenas de longas-metragens animados ou live-action?

Essas questões acompanharam parte do público que lotou a maior sala da Cinemateca Brasileira (600 lugares), para a pré-estreia de “Mauricio de Sousa – O Filme”, programada pela Mostra Internacional de Cinema de São Paulo. O novo longa mauriciano chega, nessa quinta-feira, 23 de outubro, aos cinemas de todo o país, com lançamento da poderosa Disney.

Quando o artista, o mais bem-sucedido quadrinista brasileiro, chegou, numa cadeira de rodas, ao palco da Sala Petrobras (ele completa 90 anos na próxima segunda-feira, 27) para somar-se à equipe do filme, os aplausos se multiplicaram. Mas a dúvida persistia: como manter o interesse do público, ao longo de 95 minutos, por história sem zonas de sombras? Bastavam os sorrisos que acompanharam o quadrinista em todas as suas aparições públicas? Será que veríamos momentos de dor e sofrimento? Ou assistiríamos a uma comédia como aquelas que Hollywood realizou para encantar donas de casa e mocinhas românticas, fãs de Doris Day?

Pois a cinebiografia dirigida por Pedro Vasconcelos e Rafael Salgado resultou sedutora, pois narrada com humor, muitas cores, ótimos atores, trilha sonora dos sonhos. E planos e contraplanos, como no cinema de tempos idos. E muitos, muitos!, closes (se há planos panorâmicos, raros, eles existem para ressaltar as belezas de paisagens interiorano-bucólicas, cortadas por vistoso trem-de-ferro). Ao público da Mostra, acostumado aos planos-sequência e às transgressões de linguagem, restou a fruição de narrativa feliz (e linear), composta com momentos engraçados (e prodigiosos) de menino que viveu infância paradisíaca no interior de São Paulo, cantou em emissoras de rádio, ganhou muitos prêmios (a ponto de não mais ser aceito em competições mirins) e, depois, concluiria que sua missão na vida seria desenhar, narrar historietas em quadrinhos.

Antes de atingir seu objetivo e tornar-se o mais bem-sucedido dos artistas-empresários do ramo das HQs, Mauricio enfrentaria algumas (pequenas) adversidades. Se iniciaria no jornalismo policial, seria tachado de “subversivo” (por liderar sua categoria profissional) e regressaria, aparentemente derrotado, a Mogi das Cruzes, onde tudo começara. Mas daria a volta por cima. E como daria!

O roteiro do filme, escrito por Pedro Vasconcelos e Paulo Cursino, constrói-se com ingredientes do cinema clássico, em especial, das comédias luxuosas de Hollywood. Ou das novelas das seis da Rede Globo. A imagem é coloridíssima, sem sombras. Impecáveis os figurinos e a direção de arte. Ninguém sua, fica sujo (até o Cascão tem imagem “higienizada”) ou enfrenta as dores do mundo. Não há pobres no filme. Racismo estrutural, nem pensar!

O elenco funciona como um relógio. A escolha de Mauro Sousa para interpretar o pai é um achado. Embora tenha os olhos mais puxados que os de Mauricio (a mãe de Mauro tem origem japonesa), o rapaz encarna o quadrinista com muito empenho e poder de convencimento. No palco da Cinemateca Brasileira, o inesperado protagonista contou que fizera, desde pequeno e no espaço doméstico, teatro infantil com irmãos e amigos. E que foi dedicado aluno de Artes Cênicas. Ou seja, estava ali não por ser filho do quadrinista e diretor da poderosa Mauricio de Sousa Produções. Mas por seu preparo como ator. Não decepcionou. Talvez seja risonho demais. Mas essa é a tônica que os diretores imprimiram ao filme.

Diego Laumar, que interpreta o infante Mauricio, é puro carisma. Encanta a cada cena. Seja fazendo uma traquinagem ou recebendo carinho de Vovó Dita (Elizabeth Savala). Causa frisson, até, quando canta “Granada”, sucesso de Agustin Lara (“Granada, tierra soñada por mí/ Mi cantar se vuelve gitano/ cuando es para ti/ Mi cantar hecho de fantasia/ Mi cantar flor de melancolia”).

Outro destaque do elenco é a atriz Thati Lopes, que interpreta Marilene, a primeira das três esposas de Mauricio (as outras duas são apenas citadas no final da trama, banhada com ingredientes de autoajuda e letreiro que pede ao público para aguardar, após os créditos, mensagem derradeira de Mauricio). Com veia de comediante, Thati chama atenção desde sua inusitada entrada em cena. Na pele de suspeita por determinado crime, ela é submetida a reconhecimento facial. Entre os que presenciavam o tal “reconhecimento” estava o repórter policial da Folha da Manhã, Mauricio de Sousa. Nasceriam ali uma grande (e divertida, pelo menos no filme) paixão, um casamento e três dos dez filhos do quadrinista (Mari, Mônica, a enfezada, e Magali, a comilona).

O elenco do filme foi, em boa parte, retirado das telenovelas da Globo. Caso de Elisabeth Savala, Emilio Orciollo Neto, que faz o Sr. Antônio, pai de Mauricio, e Natalia Lage, a dedicada Dona Nila, mãe do menino sonhador. Mas grandes atores, vindos do cinema e do teatro, estarão em cena, mesmo que para interpretar pequenos papéis. Os casos mais notórios são o de Othon Bastos, que dá vida ao editor Jaime Cortez, e o de Fernando Eiras, a quem cabe o personagem mais difícil da trama, o empresário Otávio Frias, dono do Grupo Folha. Como Frias foi o responsável pela criação de suplemento infantil que abrigaria as histórias de Mauricio, o filme do quadrinista exagera na louvação ao empresário. Claro que Eiras dá um show, mas quando o elogio é demais, até o santo desconfia. O pernambucano Aramis Trindade interpreta um caipira que tem medo de mula-sem-cabeça, personagem das muitas histórias que Vovó Dita conta para os netos.

A trilha de “Mauricio de Sousa – O Filme” é uma dádiva. Por tratar-se de superprodução orçada em muitos milhões de reais, não houve fonograma desejado que não fosse licenciado. Além de “Granada” e da aliciante “O Trenzinho do Caipira” (composição de Villa-Lobos, que recebeu letra de Ferreira Gullar), ouviremos canções de grandes nomes de nossa música popular. E, claro, “Aquarela”, o hit de Vinícius de Moraes e Toquinho.

Existe música mais mauriciana que esta? “Numa folha qualquer/ Eu desenho um sol amarelo/ E com cinco ou seis retas/ É fácil fazer um castelo// Com um lápis em torno da mão/ E me dou uma luva/ E se faço chover/ Com dois riscos tenho um guarda-chuva// Se um pinguinho de tinta cai num pedacinho azul de papel (…)”.

Até as crianças poderão amar a cinebiografia desse adulto que não viveu aventuras mirabolantes. E isto acontecerá porque Pedro Vasconcelos construiu uma singela comédia, daquelas que a Disney vendeu ao mundo como “um filme para toda a família”. Escapista, edificante, sedutora, irresistível.

 

Mauricio de Sousa – O Filme
Brasil, 2025, ficção, 95 minutos
Direção: Pedro Vasconcelos e Rafael Salgado
Roteiro: Pedro Vasconcelos e Paulo Cursino
Elenco: Mauro Sousa, Diego Lauma, Thati Lopes, Elisabeth Savala, Emilio Orciollo Neto, Natalia Lage, Othon Bastos, Fernando Eiras, Aramis Trindade
Fotografia: Luciano Xavier
Montagem: Lucas Vasconcelos, John Garita e Pedro Gabriel Miziara
Música original: Eduardo Resende
Direção de arte: Rita Vinagre
Produção: Tuinho Schwartz
Distribuição: Disney


Fonte: https://revistadecinema.com.br/2025/10/mauricio-de-sousa-ganha-cinebiografia-desenhada-para-seduzir-o-publico-e-narrar-seus-triunfos-como-quadrinista-e-empresario/

Conteúdo importado automaticamente pelo HOST Portal News

🔔 Clique no link, entre em nossa comunidade no WhatsApp do Guia Lacerda e receba notícias em tempo real!

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *