Afegão que vivia no Brasil vai ao país natal buscar família e não consegue sair: ‘Tenho medo de não conseguir voltar’
Empreendedor que escolheu morar em São Paulo conta a dificuldade para obter visto para a família sair do Afeganistão. Desde que o Talibã assumiu Cabul, ele diz que não sai de casa e que ninguém se sente seguro.
Masood Habibi, de 29 anos, é afegão e, em setembro de 2020, realizou o sonho de conhecer o Brasil ao vir morar em São Paulo. Em maio deste ano, voltou a seu país para trazer a família com ele. Devido à pandemia, porém, os vistos não foram concedidos. E, agora, com a tomada de poder pelo grupo extremista islâmico Talibã, está numa situação que jamais imaginou: trancado com sua esposa e o filho de 4 anos há três dias na casa do irmão.
“Não poder sair do país e voltar para o Brasil é meu maior medo”, afirmou Masood em entrevista ao G1 nesta terça-feira (17).
O empreendedor está na capital, Cabul, e conta que, apesar de estarem em casa, ninguém se sente seguro. Durante o dia, há tiroteios, tudo está fechado, muita gente tenta fugir e está deslocada de suas casas. “Ninguém sabe o que está por vir.”
“A situação é muito crítica aqui. É muito perigoso ir para fora. Cada um está ficando em casa. Meu irmão, minha esposa e meu filho estão aqui comigo”, relata.
Segundo ele, é possível ver os talibãs circulando pelas ruas. “Em todos os lugares, você pode ver os talibãs, todo o país está em estado de emergência, todos os lugares estão fechados, o aeroporto também está fechado. Muitas pessoas morreram no caos do aeroporto.”
E completa: “A situação atual é muito ruim aqui. Milhões de pessoas estão deslocadas, cada um está preocupado com o que vai acontecer. Ninguém esperava a queda do Afeganistão depois de 20 anos de ocupação [americana]”.
Masood era criança quando os Estados Unidos iniciaram a ocupação e por isso diz que não se lembra de como era o país antes disso. Mas que o medo imposto pelo Talibã voltou à tona. “Tem havido caos desde a chegada do Talibã. Alguns dos nossos amigos partiram para os EUA em avião americano. Há três dias que não saímos de casa. As pessoas têm medo de sair de casa. Muitos tiroteios são ouvidos.”
Ao ser questionado se se sentia seguro em filmar a movimentação da rua de sua janela, disse que não. “Não estamos seguros. Não é seguro filmar algo. Agora está silencioso, mas houve muitos tiros ontem. Há um caos na cidade, e as pessoas estão fugindo.”
Ele conta que sua família está abastecida de comida e água e que o acesso à internet está mantido. Sua grande preocupação, mencionada várias vezes, é obter vistos para sua família conseguir sair de Cabul o quanto antes e voltar para o Brasil, o país em que escolheu morar.
Masood afirma que enviou alguns e-mails desde maio para a Embaixada brasileira no Paquistão, para obter vistos para a mulher, o filho e o irmão, mas a resposta foi sempre a mesma: negativa.
“Eles dizem que, devido ao coronavírus, não estão emitindo. Só por isso fiquei em Cabul, senão já estaríamos no Brasil.” E espera que agora, com a situação de emergência em que se encontra o Afeganistão, a resposta mude.
O G1 entrou em contato com o Itamaraty para saber o posicionamento oficial do Ministério das Relações Exteriores sobre casos como o da família do empreendedor, mas, até a última atualização desta reportagem, não obteve resposta.
Em nota divulgada na segunda-feira (16), o ministério afirmou que o “governo brasileiro expressa sua profunda preocupação com a deterioração da situação no Afeganistão e as graves violações dos direitos humanos” e que “não há registro de brasileiros atualmente residindo ou em trânsito no Afeganistão”, mas não se manifestou sobre eventuais pedidos de refúgio.